terça-feira, 8 de dezembro de 2009

BANCO CENTRAL DO BRASIL se encontra em uma situação bastante confortável

Correio Braziliense – Coluna Brasil S/A – Fim do piloto automático – 7/12/2009

Fim do piloto automático

Olhando friamente os atuais indicadores da economia, pode-se afirmar que o
BC se encontra em uma situação bastante confortável

por Vicente Nunes
vicentenunes.df@dabr.com.br


Ainda que o consenso geral aponte pela manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 8,75% ao ano, a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começa amanhã e termina na quarta-feira está provocando um debate acalorado no mercado. A expectativa é grande pelos sinais que o Banco Central emitirá quanto aos rumos da Selic. Aposta-se que sairá de cena o “piloto automático”, que vinha indicando a estabilidade dos juros por um longo período, e entrará no horizonte um discurso de ressalvas, carregado de “ainda” e “por enquanto”, como bem define o economista Maurício Molan, do Banco Santander.

A mudança do BC não deve ser vista, porém, como um endosso às apostas mais pessimistas dos analistas que insistem na necessidade de aumento da Selic ainda nos primeiros meses de 2010. Mas servirá de indicador para os mais otimistas, para os que estão inebriados pela euforia, de que os juros poderão ser usados para corrigir distorções nos preços que venham a ser provocadas pelo crescimento excessivo da atividade econômica. Esse é o papel clássico da autoridade monetária: primar pela cautela.

Mas, olhando friamente os atuais indicadores da economia, pode-se afirmar que o BC se encontra em uma situação bastante confortável. Mesmo com a recente alta da inflação, não há qualquer perspectiva de o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechar o ano acima do centro da meta definida pelo governo, de 4,5%. Isso ficará claro na mesma quarta-feira em que será anunciada a decisão do Copom. O IPCA de novembro, ligeiramente acima de 0,4%, fará com que a inflação em 12 meses encoste nos 4,25%. Mesmo que a taxa de dezembro repita 0,4%, o índice final deverá cravar 4,3%, na pior das hipóteses.

Retomada do investimento

Com a inflação dentro das metas, o BC tenderá a priorizar os dados de indicadores de atividade em suas análises. Sabe-se que ainda há ociosidade no parque produtivo e que a retomada dos investimentos para o aumento da oferta de mercadorias é firme. O BC, no entanto, quer ver números mais consistentes sobre a ampliação de fábricas e quando os projetos de expansão estarão concluídos e prontos para abastecer a ânsia dos consumidores que veem a renda crescer e a oferta de emprego melhorar.

Vale ressaltar que um dia depois de anunciada a decisão do Copom, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrará que, no terceiro trimestre do ano, o Brasil cresceu algo como 2% em relação aos três meses anteriores, taxa que, anualizada, apontará expansão de 8%. Os dados preliminares do quarto trimestre sinalizam que o rimo de atividade continua muito forte. A grande pergunta é se esse ritmo será mantido nos primeiros dois trimestres de 2010 ou não. Para o BC, seria melhor que a demanda esfriasse um pouco, acompanhando mais de perto o aumento da produção.

Efeito da crise

Para o Ministério da Fazenda, o BC está no seu papel de mudar o discurso e começar a indicar cautela nos comunicados ao mercado. Mas isso não quer dizer que as taxas de juros tenham que subir. Para os assessores do ministro Guido Mantega, na pior das hipóteses, se realmente o ritmo de crescimento da economia for exacerbado e a inflação começar a fugir do centro da meta, a alta da Selic só deverá se concretizar no fim de 2010 e, mesmo assim, em um ritmo moderado, de no máximo 1,5 ponto percentual.

Os assessores de Mantega ressaltam ainda que não se pode esquecer que os resultados do PIB do terceiro trimestre estão contaminados pela política anticíclica que começa a ser desmontada. Os números mostrarão um salto espetacular da indústria automobilística, de eletroeletrônicos e de materiais de construção devido ao corte do IPI. No quarto trimestre, porém, os reflexos do alívio de impostos serão bem menores. O que mais pesará para o dinamismo da economia será o efeito defasado da política monetária. Tudo, portanto, dentro do que já foi alardeado pelo BC.

Temores da Fazenda

A Fazenda também não acredita que, no fim do mês, quando o BC divulgará o novo relatório de inflação, haja mudanças significativas nas projeções para o IPCA do próximo ano e de 2011. Os assessores de Mantega temem que o BC eleve as suas estimativas, alegando que foi obrigado a considerar, nos seus modelos, a redução da meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida) de 2,5% para 1,56% do PIB.

Em setembro, quando o relatório foi liberado, houve um grande estresse entre o diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, e o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa. Mesquita atribuiu o aumento das previsões de inflação à gastança desenfreada do governo. E Barbosa o taxou de “terrorista fiscal”.

Tudo leva a crer que as arestas foram aparadas. Mas melhor do que preparar um discurso público de unidade é combinar um jogo de verdade, de governo, em que os gastos controlados tirarão um peso enorme da política monetária.



VICENTE NUNES É REPÓRTER ESPECIAL E BLOGUEIRO

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