quarta-feira, 29 de setembro de 2010

CÂMBIO FLUTUANTE

do Editorial do Diário de Pernambuco de 29.09.2010

A capitalização da Petrobras tinha data, tamanho e consequências conhecidas. Uma delas, a mais comentada nos últimos meses, seria o aumento do ingresso de dólares na economia brasileira, o que, aliás, se confirmou sem grandes abalos. Especialistas mais experientes na questão cambial já previam que esse evento também marcaria uma nova etapa de pressões para que o governo venha a tomar medidas "enérgicas" para conter a valorização do real ante a moeda norte-americana. Mais do que isso, era também razoável esperar que os saudosistas do intervencionismo governamental na economia em geral e no câmbio em particular se movessem no sentido de inspirar compartimentos mais conservadores da equipe econômica a agir pela volta triunfal das cotações determinadas nos fins das tardes das sextas-feiras pela autoridade monetária.

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem conseguido, não sem esforço, resistir a esse tipo de pressão, e isso é o que se espera também do próximo ocupante do Palácio do Planalto. O maispopular dos presidentes da história republicana brasileira não tem motivos para se arrepender de ter optado por ficar prioritariamente do lado do poder compra dos salários do trabalhador. Lula percebeu o papel do câmbio flutuante em relação à realidade da economia e, principalmente, que essa política cambial facilitaria o combate à inflação, à medida que permite a comparação de preços com as demais ofertas no mercado internacional. Com isso, fica reduzida a capacidade do fornecedor brasileiro de fixar preço de acordo com a sua conveniência e não conforme sua capacidade de disputar mercados, inclusive o interno.

A não intervenção no câmbio força a modernização da indústria nacional. É claro que esse esforço seria mais bem-sucedido se amparado por consistentes políticas de estímulo ao investimento, por eficiente infraestrutura básica e por carga tributária mais leve e mais parecida com a dos nossos concorrentes mundiais. Mesmo assim, a manutenção do câmbio flutuante tem mostrado ser a solução mais adequada para reduzir a vulnerabilidade externa da economia brasileira. Persiste uma defasagem na competitividade do país, o que naturalmente se acirra com a perda crescente de valor do dólar, principal moeda de troca do planeta, fenômeno que tem motivações muito além da questão brasileira, mas que, nem por isso, pode ser menosprezada.

É nesse sentido que se justifica a atuação correta do Banco Central de enxugar o excesso de liquidez da moeda norte-americana na economia brasileira, fazendo aquisições maciças e, com elas, reforçando as reservas cambiais, hoje acima de US$ 260 bilhões. Foi esse colchão, aliás, que ajudou a aumentar a credibilidade do Brasil no mercado internacional de capitais, a ponto de receber graduação de investimento pelas maiores agências de risco do mundo. Portanto, dispensável ou não, a anunciada disponibilização dos recursos do Fundo Soberano do Brasil (FSB) para o esforço de contenção de eventuais excessos de dólares na economia, especialmente na vaga da capitalização da Petrobras, pode ser positiva. Mas que não sirva de chave para reabrir a porta da velha política do câmbio administrado pelos sábios do governo, um retrocesso pelo qual poderemos pagar caro, como aconteceu no passado.

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