sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A ONU precisa de uma reforma

Editorial do Diário de Pernambuco
Edição de sexta-feira, 12 de novembro de 2010


Condenar os Estados Unidos pela injeção de US$ 600 bilhões na economia é pretender atar a maior potência do planeta, que tenta se reerguer depois de enfrentar uma das maiores crises financeiras da história, sem conseguir assegurar postos de trabalhos suficientes para os cidadãos. Ainda que não seja menos verdadeira a afirmação de que a medida interna repercute negativamente sobre outras nações e acirra a guerra cambial, Washington exerce direito de defesa legítimo. Mais: bem sucedida, a reação do Federal Reserve, o banco central norte-americano, pode, a médio prazo, render bons resultados para a comunidade internacional.

Nada disso, porém, torna menos urgente a necessidade de construção de uma governança global, calçada no multilateralismo, com poder de arbítrio e de enfrentamento de questões pontuais que desequilibram os mercados. Desde o tsunami que varreu o mundo em 2008, a partir do estouro da bolha imobiliária em Wall Street, essa é uma exigência imperativa da globalização. E essa é a tarefa sobre a qualdeveriam, mas não vão, se debruçar as oito nações mais industrializadas e as 12 principais potências emergentes do mundo, que se reúnem na Cúpula do G-20 em Seul (Coreia do Sul). Uma vez mais, não se espera que os líderes cumpram o seu papel.

O predomínio da lei da sobrevivência, em que cada um busca se proteger sem preocupações para além das próprias fronteiras, termina mal para todos. Prova-o o efeito estufa. Frustram-se inúmeras tentativas de contenção do aquecimento global, enquanto o degelo eleva o nível dos oceanos e altera o clima em todo o planeta, com consequências funestas do Polo Sul ao Polo Norte. Na economia não é diferente. A desvalorização artificial de moedas pelos países para inserção mais vantajosa dos produtos nacionais no mercado internacional provoca desequilíbrios que desarrumam os sistemas cambial, monetário e comercial.

Nota dissonante no concerto das nações, o unilateralismo dissimulado cobre de ceticismo a Cúpula do G-20. Não se espera que o marxismo chinês abandone o contraditório exacerbamento do mercantilismo com políticas de fortalecimento do yuan. Da mesma forma, os EUA não deixarão de adotar medidas de recuperação econômica para valorizar o dólar. Propõe-se saída global, com a definição de ´parâmetros indicativos`, espécie de sistema sismológico para detectar terremotos cambiais, monetários e comerciais. A sugestão é válida, mas, no contexto, suscita mais dúvidas que certezas. A primeira é óbvia: a quem caberá o controle?

O G-20 reúne os emergentes com as grandes potências, mas não lhes dá poder para mudar regras. Tende, pois, a prevalecer em Seul a lei da selva, a política do protecionismo, com cada país entrando no jogo do mercado com normas próprias. A necessária governança global, que crie condições de equilíbrio para todos, carece de fórum mais amplo e legítimo: as Nações Unidas. Desde que reformulada, a ONU, sim, seria o palco adequado para uma revisão dos acordos de Bretton Woods, em que as nações mais industrializadas vencedoras da Segunda Guerra definiram, em julho de 1944, as ainda vigentes regras comerciais e financeiras das relações mundiais, arcabouço superado pela globalização.

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